sábado, 12 de dezembro de 2009

VIDA BOA

Passei boa parte da minha juventude praticando surfe. Sem precisar dividir praia, sol, muito menos onda com ninguém.“Eu não trabalhava, eu não sabia, não criava, também não destruía”. Como diriam os Titãs.
Destruía sim, as ondas da Praia Brava da Almada, a 15 minutos de casa.
Acordava, tomava café reforçado com ovos e farinha de mandioca, pegava a prancha e a camiseta.
Estava pronto o kit surfe, parafina era a vela derretida. Depois de pingar vela na prancha, pegava um pedaço de madeira com ponta fina para raspar onde era colocado o pé. Nem precisa dizer porquê não tinha parafina, não trabalhava então não tinha grana pra comprar.
Estava pronto para mais um dia de surfe, protetor solar, nunca lembrava, não tinha mesmo pra passar. Hoje, meu rosto, mostra pés de galinha fruto dos dias de sol escaldante daqueles anos de surfe.
Mas foram os melhores anos da minha vida. Vida sem responsabilidade, sem filho, sem contas, funcionários, cachorro...
Passava o dia todo na água, na hora da fome recorria ao famoso abricó, fruto muito apreciado pelos animais, mas pouco apreciado pelos humanos.
Antes de comer abricó passava na casa do Dinga e do seu Mandico, onde sempre tinha banana madura. Eles já sabiam o motivo da visita. O Dinga se fazia de desentendido, só para ver minha reação. Depois pegava uma penca de banana nanica e colocava em cima de uma bancada que até hoje guarda as louças da casa. Não precisava falar duas vezes, já sabia que era para mim, falava obrigado e estava pronto o almoço.
Após o almoço lá estava eu na água, sozinho pegando as melhores ondas em uma das melhores e mais bonitas praias de Ubatuba.
Só voltava pra casa no fim da tarde, isso porque tinha o tradicional futebol de areia entre os moradores da Almada, ainda tem. Jogava-se até anoitecer. Após o jogo tinha o papo com os amigos, regado à cerveja gelada.
Consertar a prancha foi uma das coisas que tive que aprender nessa minha jornada de surfista, não foi muito difícil. Conheci Augusto Mota, dono da HIDROFLEX, ele entendeu a dificuldade em trazer a prancha para a cidade e me ensinou todos os macetes do conserto. Ainda me deu todo o material. Saí dali maravilhado com o aprendizado e a gentileza do dono da fabrica, já que ele nunca havia me visto na vida.
Alguns anos depois, me arrisquei nas competições. Participei de duas, em uma, consegui passar três baterias, fiquei em 5º lugar. Já na outra não passei da primeira. Consegui um patrocínio para pagar as inscrições. Mas logo em seguida parei com o surfe.
Agora, no auge dos meus 36 anos, casado, com um filho pra criar, um bar na praia, comprei outra prancha, só usei duas vezes, ficou aqui por um bom tempo, acabei dando para um sobrinho da minha mulher.
foi junto a ultima chance de voltar.

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